Quinze minutos depois, eu ainda me encontrava naquela mesma posição, com a cabeça apoiada numa mão e quase dormindo. Olhei vagamente pra enorme tela à minha frente, tentando não adormecer, e vendo que não ia agüentar ficar acordada ali por muito mais tempo, resolvi tomar uma atitude drástica. Me levantei sorrateiramente, trazendo minha mochila comigo, e caminhei até o professor Araripe, que estava sentado na primeira fileira ao lado do professor Aguiar.
- Professor, posso ir ao banheiro? – falei, baixinho, fazendo cara de cachorrinho sem dono – É urgente.
- Estamos na metade do documentário, Messi – ele murmurou, com sua habitual expressão afetada – Tem certeza de que precisa ir?
- É realmente necessário – respondi, ignorando o olhar do sr. Aguiar praticamente me queimando de tão intenso. O sr. Araripe ergueu uma sobrancelha, pensativo, e logo resmungou, derrotado:
- Saindo dessa sala, é a primeira porta à direita.
- Obrigada – sorri, aliviada, e saí de fininho pela porta. A chuva tinha dado uma trégua mínima, deixando apenas uma garoa fina cair, o que já me dava uma certa liberdade pra respirar um pouco de ar fresco sem me molhar. Pelo amor de Deus, nunca mais pretendia voltar àquela reserva se fosse pra assistir a documentários como aquele. Fala sério, até uma criança de cinco anos sabe que a fumaça que sai das chaminés das fábricas prejudica a qualidade do ar.
Mais entediada do que nunca, peguei meu celular do bolso da mochila pra ver as horas, e meu tédio só aumentou quando vi que ainda faltava muito pra irmos embora. Lógico, sua anta, acabamos de chegar. Aposto que se Mica tivesse vindo, tudo estaria sendo muito melhor, e eu estaria nas nuvens, sorridente e cheia de paciência pra agüentar qualquer chatice que aquele lugar me proporcionasse. Suspirei tristemente, tão a fim de ir embora que toparia voltar a pé pra casa, e tive uma idéia. Digitei rapidamente o número do celular de Sophia e apertei o botão para chamar. Uns dois minutinhos de conversa ao telefone com alguém civilizado seria no mínimo revigorante. Assim que ouvi uma gravação da operadora dizendo que meu celular estava sem sinal, quase o deixei cair de susto por causa da segunda voz que surgiu atrás de mim.
- Não achou o banheiro, Messi? – o sr. Aguiar perguntou, irônico. Me virei depressa, cancelando a chamada, e logo seus olhos castanhos entraram em foco.
- Que é, tá me seguindo agora? – rosnei, sem a menor paciência, e fazendo um breve silêncio ocupar nossos ouvidos por alguns segundos.
- Se eu não soubesse dessa sua… Simpatia com professores de biologia, suas respostas atravessadas seriam desanimadoras – ele finalmente respondeu, com um cinismo impressionante no rosto, típico de alguém que sabia demais. Meus olhos se arregalaram um pouco sem que eu percebesse, minha garganta secou, meu coração acelerou, tudo ao mesmo tempo. Ele não sabia. Ele não podia saber.
- Do que você tá falando? – perguntei, usando toda a minha capacidade de mentir para controlar meus músculos faciais e não me entregar. O professor Aguiar deu uma risadinha irônica e cruzou os braços.
- Ah… Você não sabe do que eu tô falando? – ele repetiu, com os olhos cravados nos meus e dando um passo na minha direção – Então bastou uma briguinha pro Mica ser carta fora do baralho? Rapidinha você, hein.
Senti uma raiva imensa subir pela minha garganta, por pouco me fazendo voar naquele desgraçado. Merda, ele sabia. Provavelmente Mica tinha lhe contado tudo, enganado por sua pose de bom moço. Até da nossa briga de dois dias atrás ele já sabia! Respirei fundo, controlando a fúria engasgada em minha garganta, e com a voz firme, retruquei:
- Me deixa em paz.
- Parece que agora você sabe bem do que eu tô falando – o sr. Aguiar sorriu, com um olhar no mínimo divertido – Podemos conversar de igual pra igual.
- Eu nunca vou ser igual a você – falei, quase esmagando meu celular em minha mão, que agora estava fechada num punho – Preferiria me matar a viver tendo nojo de mim mesma.
- Não venha se fazer de coitadinha, Messi, eu sei muito bem as besteiras que você tem falado sobre mim – ele disse, dando mais um passo na minha direção – O Borges me conta tudo sobre vocês, cada detalhe, cada palavra de cada conversa, e eu não gostei nada de saber que você anda colocando as garrinhas de fora.
- Garrinhas de fora? Eu? Tem certeza de que essa fala não era pra ser minha? – eu reclamei, inconformada, com a testa franzida e a voz um pouco mais alta – Se alguém aqui anda aprontando alguma, esse alguém é você!
- Não sei se você sabe, mas é muito feio acusar alguém sem provas – ele falou, com a expressão carregada e um olhar irritado – Então eu acho melhor você ficar quietinha no seu canto se não quiser arcar com as conseqüências.
- E que conseqüências seriam essas? Por acaso você tem provas contra mim? – perguntei, erguendo as sobrancelhas num tom intimidador, e como ele não disse nada, deixei todo o ódio reprimido transbordar – Na primeira tentativa de aprontar qualquer coisa, Aguiar, eu simplesmente entro naquela porcaria de diretoria e conto tudo que você já me fez, e que se danem as provas. Acho que a diretora não vai gostar nada de saber das suas estripulias, e aí vai ser a palavra de uma aluna indefesa contra a de um professor com fama de pedófilo. Mesmo que não te expulsem daquela espelunca, sua imagem de bom moço não vai durar muito tempo.
Arthur ficou me encarando por alguns segundos, e eu senti em seu olhar ameaçador que tinha conseguido o que queria: deixá-lo furioso. Após longos segundos com o maxilar tenso, ele finalmente murmurou, cheio de raiva:
- Pode me ferrar, mas pode ter certeza de que eu levo seu querido Borges comigo.
Engoli em seco. Não, ele não teria como incriminar Mica, tomávamos todas as precauções possíveis e imagináveis. Definitivamente ele estava blefando.
- Sabe o que eu acho? – perguntei, com um sorrisinho debochado e as sobrancelhas erguidas em tom de superioridade – Que você tem inveja do Borges.
O professor Aguiar fez cara de incredulidade, como se Mica fosse um merda, o que só me fez continuar:
- É isso mesmo, você se morde de inveja dele. E sabe por quê? Porque você nunca foi, não é e nunca vai ser nem metade do homem que ele é. E por ser tão mais homem que você, ele não precisou nem suar pra conseguir a garota que você sempre quis, mas nunca teve decência suficiente pra conseguir.
- Professor, posso ir ao banheiro? – falei, baixinho, fazendo cara de cachorrinho sem dono – É urgente.
- Estamos na metade do documentário, Messi – ele murmurou, com sua habitual expressão afetada – Tem certeza de que precisa ir?
- É realmente necessário – respondi, ignorando o olhar do sr. Aguiar praticamente me queimando de tão intenso. O sr. Araripe ergueu uma sobrancelha, pensativo, e logo resmungou, derrotado:
- Saindo dessa sala, é a primeira porta à direita.
- Obrigada – sorri, aliviada, e saí de fininho pela porta. A chuva tinha dado uma trégua mínima, deixando apenas uma garoa fina cair, o que já me dava uma certa liberdade pra respirar um pouco de ar fresco sem me molhar. Pelo amor de Deus, nunca mais pretendia voltar àquela reserva se fosse pra assistir a documentários como aquele. Fala sério, até uma criança de cinco anos sabe que a fumaça que sai das chaminés das fábricas prejudica a qualidade do ar.
Mais entediada do que nunca, peguei meu celular do bolso da mochila pra ver as horas, e meu tédio só aumentou quando vi que ainda faltava muito pra irmos embora. Lógico, sua anta, acabamos de chegar. Aposto que se Mica tivesse vindo, tudo estaria sendo muito melhor, e eu estaria nas nuvens, sorridente e cheia de paciência pra agüentar qualquer chatice que aquele lugar me proporcionasse. Suspirei tristemente, tão a fim de ir embora que toparia voltar a pé pra casa, e tive uma idéia. Digitei rapidamente o número do celular de Sophia e apertei o botão para chamar. Uns dois minutinhos de conversa ao telefone com alguém civilizado seria no mínimo revigorante. Assim que ouvi uma gravação da operadora dizendo que meu celular estava sem sinal, quase o deixei cair de susto por causa da segunda voz que surgiu atrás de mim.
- Não achou o banheiro, Messi? – o sr. Aguiar perguntou, irônico. Me virei depressa, cancelando a chamada, e logo seus olhos castanhos entraram em foco.
- Que é, tá me seguindo agora? – rosnei, sem a menor paciência, e fazendo um breve silêncio ocupar nossos ouvidos por alguns segundos.
- Se eu não soubesse dessa sua… Simpatia com professores de biologia, suas respostas atravessadas seriam desanimadoras – ele finalmente respondeu, com um cinismo impressionante no rosto, típico de alguém que sabia demais. Meus olhos se arregalaram um pouco sem que eu percebesse, minha garganta secou, meu coração acelerou, tudo ao mesmo tempo. Ele não sabia. Ele não podia saber.
- Do que você tá falando? – perguntei, usando toda a minha capacidade de mentir para controlar meus músculos faciais e não me entregar. O professor Aguiar deu uma risadinha irônica e cruzou os braços.
- Ah… Você não sabe do que eu tô falando? – ele repetiu, com os olhos cravados nos meus e dando um passo na minha direção – Então bastou uma briguinha pro Mica ser carta fora do baralho? Rapidinha você, hein.
Senti uma raiva imensa subir pela minha garganta, por pouco me fazendo voar naquele desgraçado. Merda, ele sabia. Provavelmente Mica tinha lhe contado tudo, enganado por sua pose de bom moço. Até da nossa briga de dois dias atrás ele já sabia! Respirei fundo, controlando a fúria engasgada em minha garganta, e com a voz firme, retruquei:
- Me deixa em paz.
- Parece que agora você sabe bem do que eu tô falando – o sr. Aguiar sorriu, com um olhar no mínimo divertido – Podemos conversar de igual pra igual.
- Eu nunca vou ser igual a você – falei, quase esmagando meu celular em minha mão, que agora estava fechada num punho – Preferiria me matar a viver tendo nojo de mim mesma.
- Não venha se fazer de coitadinha, Messi, eu sei muito bem as besteiras que você tem falado sobre mim – ele disse, dando mais um passo na minha direção – O Borges me conta tudo sobre vocês, cada detalhe, cada palavra de cada conversa, e eu não gostei nada de saber que você anda colocando as garrinhas de fora.
- Garrinhas de fora? Eu? Tem certeza de que essa fala não era pra ser minha? – eu reclamei, inconformada, com a testa franzida e a voz um pouco mais alta – Se alguém aqui anda aprontando alguma, esse alguém é você!
- Não sei se você sabe, mas é muito feio acusar alguém sem provas – ele falou, com a expressão carregada e um olhar irritado – Então eu acho melhor você ficar quietinha no seu canto se não quiser arcar com as conseqüências.
- E que conseqüências seriam essas? Por acaso você tem provas contra mim? – perguntei, erguendo as sobrancelhas num tom intimidador, e como ele não disse nada, deixei todo o ódio reprimido transbordar – Na primeira tentativa de aprontar qualquer coisa, Aguiar, eu simplesmente entro naquela porcaria de diretoria e conto tudo que você já me fez, e que se danem as provas. Acho que a diretora não vai gostar nada de saber das suas estripulias, e aí vai ser a palavra de uma aluna indefesa contra a de um professor com fama de pedófilo. Mesmo que não te expulsem daquela espelunca, sua imagem de bom moço não vai durar muito tempo.
Arthur ficou me encarando por alguns segundos, e eu senti em seu olhar ameaçador que tinha conseguido o que queria: deixá-lo furioso. Após longos segundos com o maxilar tenso, ele finalmente murmurou, cheio de raiva:
- Pode me ferrar, mas pode ter certeza de que eu levo seu querido Borges comigo.
Engoli em seco. Não, ele não teria como incriminar Mica, tomávamos todas as precauções possíveis e imagináveis. Definitivamente ele estava blefando.
- Sabe o que eu acho? – perguntei, com um sorrisinho debochado e as sobrancelhas erguidas em tom de superioridade – Que você tem inveja do Borges.
O professor Aguiar fez cara de incredulidade, como se Mica fosse um merda, o que só me fez continuar:
- É isso mesmo, você se morde de inveja dele. E sabe por quê? Porque você nunca foi, não é e nunca vai ser nem metade do homem que ele é. E por ser tão mais homem que você, ele não precisou nem suar pra conseguir a garota que você sempre quis, mas nunca teve decência suficiente pra conseguir.
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