Engoli em seco, rezando pra que ele desistisse daquela idéia, ou pra que outra pessoa viesse em nossas cabeças e pudesse substituí-lo. Droga, seria tão difícil assim arranjar alguém que não fosse um poço de luxúria pra nos dar uma carona? Além do mais, ele ficaria no mínimo louco de raiva por ter que voltar ao lugar de onde havia acabado de sair, o que não seria algo exatamente bom, tanto para nós como para ele. A simples idéia de ter que interagir com um Arthur irritado me dava uma pontada de medo.
- O Thur? – balbuciei, tentando não demonstrar minha resistência àquela sugestão e buscando desesperadamente um bom empecilho – Mas… E o seu carro, como fica? Se ele aceitar vir nos buscar, terá que vir com o carro dele, ou seja, um dos dois vai ficar sobrando… Não daria muito certo.
Segurei uma risada maléfica diante de minha brilhante escapatória, mas o ar ainda tranqüilo de Mica ao me responder não me permitiu continuar tão alegre.
- Ah, quanto a isso não precisamos nos preocupar – ele deu de ombros pesarosamente – Quando o empregado vier arrumar a casa amanhã, ele mesmo leva o carro do Thur de volta pra Londres. Além do mais, o Aguiar tem dois carros, fora a moto, não vai sentir tanta falta de um deles se tiver que deixá-lo aqui por alguns dias.
- Ah… Entendi – foi tudo que consegui dizer, totalmente desmoralizada pela resposta de Mica. O dinheiro é uma merda, especialmente quando pertence às pessoas erradas. E que engraçado, ele sempre pertencia às pessoas erradas!
- Então… Acho que ele é nossa única saída – Mica murmurou, extremamente sem graça pelo desânimo em meu rosto, e eu apenas suspirei, sem outra solução para nosso problema. Era só me controlar, só isso… Algumas horas dentro de um carro com Arthur e Mica? Tsc, moleza, fala sério.
Mica pegou o celular que estava na cama e ligou para o amigo, sob meu olhar disfarçadamente apreensivo. Conforme ele conversava com Arthur, eu tentava deduzir sua resposta, e ao mesmo tempo, inevitavelmente imaginava como ele estaria respondendo. Com sono, sem dúvida. E mal-humorado, talvez? É, grandes chances de mau humor.
- Erm, é… Obrigado, cara… E desculpa mais uma vez – Mica agradeceu pouco antes de desligar, sem graça, e assim que o fez, olhou pra mim com a expressão tristonha – Ele tá vindo… Só espero que não durma pelo caminho, porque até eu fiquei com sono só de ouvir a voz dele.
- Hm – murmurei, engolindo a sincera pena que senti dele, junto com a vontade de falar um palavrão dos bem cabeludos. Agora era oficial: eu estava ferrada. Muito ferrada.
Arrumei nossas coisas dentro das mochilas rapidamente, me vesti, e ficamos esperando o tempo passar, vendo um pouco de TV e conversando menos ainda. Um silêncio estranho caiu sobre nós, mas eu não me incomodei com ele. Confesso que a lembrança de que Arthur estava a caminho quase me fez subir pelas paredes de nervosismo em alguns momentos, mas sempre que eu estava prestes a fazê-lo, Mica iniciava timidamente algum assunto e eu me recompunha.
Quando o que me pareceu o milésimo seriado de TV estava acabando, um fraco ruído de motor ecoou do lado de fora da casa, me fazendo prender a respiração. De repente, passar o resto da vida dentro daquele quarto me pareceu uma opção muito mais fácil do que sair dele e ter que encarar Arthur outra vez. Um frio com o qual eu já estava relativamente acostumada dominou meu interior, me deixando levemente ofegante, mas eu respirei fundo e simplesmente o ignorei. Ou pelo menos tentei.
- Acho que ele chegou – falei, sem nem pensar, e Mica, que também parecia ter notado o barulho do lado de fora, pediu:
- Vai lá dar uma olhada, por favor?
Me esgueirei até a janela, sentindo meu coração revirar a cada passo, e assim que o carro de Mica entrou em meu campo de visão, vi também a moto amarela e linda de Arthur (e obviamente, seu dono sobre ela). Ele desceu da moto, com óculos escuros que o deixavam simplesmente irresistível, um casaco de moletom branco que, mesmo sendo de um tecido relativamente grosso, não conseguia disfarçar sua forma física impecável, e uma calça jeans clara. Nem preciso mencionar os tênis extremamente brancos e perfeitos e o cabelo desajeitado pelo vento de um jeito extremamente sedutor, certo?
- É, ele… Ele chegou – falei, com muito esforço pra respirar, e só desgrudei meus olhos dele quando não era mais possível vê-lo pela janela. Pude ouvi-lo abrir a porta no andar de baixo e subir as escadas, arrastando os pés a cada degrau, como se aquilo lhe custasse a vida. Arthur entrou no quarto, colocando os óculos escuros na gola da camiseta, e a única coisa que fez foi olhar para Mica e arregalar levemente seus olhos cansados.
- Caralho, Borges… Que cagada.
- É, eu sei – Mica resmungou, encarando o amigo com um olhar envergonhado. Não sei por que, mas senti uma vontade enorme de gargalhar. Como tenho amor à minha vida (pode até não parecer em alguns momentos, mas eu juro que tenho), me contentei em continuar quieta, interpretando parte da mobília do quarto.
- Bom… Vamos? - Arthur perguntou, parecendo segurar o riso assim como eu, e me lançou um rápido olhar divertido. Foi impossível não sorrir de volta, mesmo que discretamente, e uma incrível vontade de abraçá-lo e sentir a textura macia de seu casaco surgiu em minha mente.
- Claro, eu só preciso de ajuda pra me levantar – Mica apressou-se em responder, me lançando um olhar embaraçado. Entendendo o recado, assenti depressa, com medo de ter viajado demais nos caminhos sinuosos do olhar de Arthur, e caminhei até a cama para ajudá-lo a ficar de pé. Estendi uma mão para que ele se apoiasse, e quando fui oferecer a outra, a mão deArthur substituiu o vazio, e sua presença inesperadamente próxima me arrepiou da cabeça aos pés.
- Se você pretende mesmo levantar, acho melhor se apoiar em alguém forte de verdade – Arthur explicou, quando Mica o olhou surpreso, e por mais incrível que isso possa parecer, não identifiquei nenhum rastro de provocação implícita em sua voz. Tentei engolir uma resposta diante da surpreendente educação dele, mas a vontade de retrucar foi mais forte do que eu.
- Eu sou forte de verdade – murmurei, mais pra mim mesma do que para ele, tentando abafar meu leve incômodo com seu comentário, que até então, me parecia benigno. O problema era que, por mais que eu realmente achasse que Arthur conseguiria ajudá-lo a se levantar com mais habilidade do que eu, meu humor sempre ficava um pouco fora dos eixos diante da presença dele, pendendo pra uma certa rispidez desnecessária.
- O Thur? – balbuciei, tentando não demonstrar minha resistência àquela sugestão e buscando desesperadamente um bom empecilho – Mas… E o seu carro, como fica? Se ele aceitar vir nos buscar, terá que vir com o carro dele, ou seja, um dos dois vai ficar sobrando… Não daria muito certo.
Segurei uma risada maléfica diante de minha brilhante escapatória, mas o ar ainda tranqüilo de Mica ao me responder não me permitiu continuar tão alegre.
- Ah, quanto a isso não precisamos nos preocupar – ele deu de ombros pesarosamente – Quando o empregado vier arrumar a casa amanhã, ele mesmo leva o carro do Thur de volta pra Londres. Além do mais, o Aguiar tem dois carros, fora a moto, não vai sentir tanta falta de um deles se tiver que deixá-lo aqui por alguns dias.
- Ah… Entendi – foi tudo que consegui dizer, totalmente desmoralizada pela resposta de Mica. O dinheiro é uma merda, especialmente quando pertence às pessoas erradas. E que engraçado, ele sempre pertencia às pessoas erradas!
- Então… Acho que ele é nossa única saída – Mica murmurou, extremamente sem graça pelo desânimo em meu rosto, e eu apenas suspirei, sem outra solução para nosso problema. Era só me controlar, só isso… Algumas horas dentro de um carro com Arthur e Mica? Tsc, moleza, fala sério.
Mica pegou o celular que estava na cama e ligou para o amigo, sob meu olhar disfarçadamente apreensivo. Conforme ele conversava com Arthur, eu tentava deduzir sua resposta, e ao mesmo tempo, inevitavelmente imaginava como ele estaria respondendo. Com sono, sem dúvida. E mal-humorado, talvez? É, grandes chances de mau humor.
- Erm, é… Obrigado, cara… E desculpa mais uma vez – Mica agradeceu pouco antes de desligar, sem graça, e assim que o fez, olhou pra mim com a expressão tristonha – Ele tá vindo… Só espero que não durma pelo caminho, porque até eu fiquei com sono só de ouvir a voz dele.
- Hm – murmurei, engolindo a sincera pena que senti dele, junto com a vontade de falar um palavrão dos bem cabeludos. Agora era oficial: eu estava ferrada. Muito ferrada.
Arrumei nossas coisas dentro das mochilas rapidamente, me vesti, e ficamos esperando o tempo passar, vendo um pouco de TV e conversando menos ainda. Um silêncio estranho caiu sobre nós, mas eu não me incomodei com ele. Confesso que a lembrança de que Arthur estava a caminho quase me fez subir pelas paredes de nervosismo em alguns momentos, mas sempre que eu estava prestes a fazê-lo, Mica iniciava timidamente algum assunto e eu me recompunha.
Quando o que me pareceu o milésimo seriado de TV estava acabando, um fraco ruído de motor ecoou do lado de fora da casa, me fazendo prender a respiração. De repente, passar o resto da vida dentro daquele quarto me pareceu uma opção muito mais fácil do que sair dele e ter que encarar Arthur outra vez. Um frio com o qual eu já estava relativamente acostumada dominou meu interior, me deixando levemente ofegante, mas eu respirei fundo e simplesmente o ignorei. Ou pelo menos tentei.
- Acho que ele chegou – falei, sem nem pensar, e Mica, que também parecia ter notado o barulho do lado de fora, pediu:
- Vai lá dar uma olhada, por favor?
Me esgueirei até a janela, sentindo meu coração revirar a cada passo, e assim que o carro de Mica entrou em meu campo de visão, vi também a moto amarela e linda de Arthur (e obviamente, seu dono sobre ela). Ele desceu da moto, com óculos escuros que o deixavam simplesmente irresistível, um casaco de moletom branco que, mesmo sendo de um tecido relativamente grosso, não conseguia disfarçar sua forma física impecável, e uma calça jeans clara. Nem preciso mencionar os tênis extremamente brancos e perfeitos e o cabelo desajeitado pelo vento de um jeito extremamente sedutor, certo?
- É, ele… Ele chegou – falei, com muito esforço pra respirar, e só desgrudei meus olhos dele quando não era mais possível vê-lo pela janela. Pude ouvi-lo abrir a porta no andar de baixo e subir as escadas, arrastando os pés a cada degrau, como se aquilo lhe custasse a vida. Arthur entrou no quarto, colocando os óculos escuros na gola da camiseta, e a única coisa que fez foi olhar para Mica e arregalar levemente seus olhos cansados.
- Caralho, Borges… Que cagada.
- É, eu sei – Mica resmungou, encarando o amigo com um olhar envergonhado. Não sei por que, mas senti uma vontade enorme de gargalhar. Como tenho amor à minha vida (pode até não parecer em alguns momentos, mas eu juro que tenho), me contentei em continuar quieta, interpretando parte da mobília do quarto.
- Bom… Vamos? - Arthur perguntou, parecendo segurar o riso assim como eu, e me lançou um rápido olhar divertido. Foi impossível não sorrir de volta, mesmo que discretamente, e uma incrível vontade de abraçá-lo e sentir a textura macia de seu casaco surgiu em minha mente.
- Claro, eu só preciso de ajuda pra me levantar – Mica apressou-se em responder, me lançando um olhar embaraçado. Entendendo o recado, assenti depressa, com medo de ter viajado demais nos caminhos sinuosos do olhar de Arthur, e caminhei até a cama para ajudá-lo a ficar de pé. Estendi uma mão para que ele se apoiasse, e quando fui oferecer a outra, a mão deArthur substituiu o vazio, e sua presença inesperadamente próxima me arrepiou da cabeça aos pés.
- Se você pretende mesmo levantar, acho melhor se apoiar em alguém forte de verdade – Arthur explicou, quando Mica o olhou surpreso, e por mais incrível que isso possa parecer, não identifiquei nenhum rastro de provocação implícita em sua voz. Tentei engolir uma resposta diante da surpreendente educação dele, mas a vontade de retrucar foi mais forte do que eu.
- Eu sou forte de verdade – murmurei, mais pra mim mesma do que para ele, tentando abafar meu leve incômodo com seu comentário, que até então, me parecia benigno. O problema era que, por mais que eu realmente achasse que Arthur conseguiria ajudá-lo a se levantar com mais habilidade do que eu, meu humor sempre ficava um pouco fora dos eixos diante da presença dele, pendendo pra uma certa rispidez desnecessária.
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