terça-feira, 6 de dezembro de 2011

WEB LuAr - Capítulo 9 / Parte 2 :

 
- Se quiser que eu piore, é só falar - ela resmungou, totalmente desmoralizada, e eu engoli o riso. O assunto era sério, apesar do fracasso de Maria como chantagista. 
- Não, eu aceito essas condições - assenti, colocando as mãos nos bolsos do vestido - Bom, se for só isso, eu já vou indo. 
- Mas já? Pra que a pressa? - Maria perguntou, franzindo a testa do seu jeito cínico sem tirar um sorrisinho de canto do rosto - Bebe alguma coisa, senta um pouquinho. As meninas têm várias perguntas pra te fazer. 
- Perguntas? - repeti, sem entender - Sobre o que? 
- Oras, conquistar o professor mais desejado e intocado da escola não é motivo de curiosidade? - ela sorriu, encostando-se na porta e me impedindo de sair. Que absurdo, meu Deus do céu. Aquilo só podia ser uma piada. Como ela e as amiguinhas conseguiam ser tão putas? 
- Você já conseguiu o que queria, agora me deixa ir embora - rosnei, quase dando um soco na fuça dela. 
- Acho que esqueci de te avisar que os favores que vai fazer pra mim começam hoje - ela disse, como se eu tivesse problemas mentais e só entendesse as palavras se fossem ditas numa velocidade mais lenta que a normal - E o primeiro deles é ficar até o fim da festa. Quero ver como você se sai num ambiente completamente diferente do qual você tá acostumada a ficar. Talvez não seja tão divertido pra você, mas aposto que vou adorar a experiência. 
Pude ver minha cara de perplexidade refletida nos olhos brilhantes de malícia de Maria, e soltei um suspiro derrotado ao pensar no que estava em jogo ali. Minha relação com Mica, minha felicidade estava em risco, era um segredo perigoso demais pra arriscar uma rebeldia contra as condições dela. 
- Que seja - murmurei, evitando encará-la e ver a alegria maldosa em seu rosto. Maria abriu a porta com um sorriso, finalmente me deixando sair, e eu a acompanhei até o andar de baixo, sem acreditar na cilada na qual eu tinha acabado de cair. 
- A casa é sua, 
querida - Maria disse, cínica, quando descemos o último degrau da grande escadaria de mármore - Fique à vontade… Se conseguir. 
Soltei um suspiro fúnebre enquanto me encaminhava pra qualquer lugar daquela mansão, fazendo questão de seguir a direção oposta à de Maria. Por onde eu passava, via pessoas conhecidas da escola, e as poucas ainda sóbrias demonstravam curiosidade por me ver naquele lugar. Encontrei um balcão onde um rapaz preparava alguns drinques, e resolvi ficar por lá, já que a meia dúzia de pessoas sentadas ali pareciam estar bêbadas demais pra sequer se mexer. 
- Cerveja, por favor - rosnei ao barman, com a garganta coçando por álcool. Se era pra encarar aquele martírio, que algo me ajudasse a passar o tempo mais rápido. Não sei te dizer em quantas línguas diferentes eu xingava Maria em pensamento por me manter presa naquela festa horrorosa. Ela sabia muito bem que eu não suportava ficar em lugares como aquele, e ainda me forçava a aturar aquele bando de gente que eu já odiava quando estavam lúcidos, e conseguia odiar mais ainda quando estavam bêbados. 
O barman logo me entregou uma latinha de cerveja, cuja metade do conteúdo eu mandei garganta abaixo de uma vez só, sem hesitar. Sentindo o líquido gelado descer dentro de mim, voltei a observar a bagunça na qual aquela casa tinha se transformado. Nada parecia estar em seu lugar, ninguém parecia estar em seu juízo perfeito… A não ser aqueles olhos. 
Franzi a testa de leve, me perguntando se aquilo já era efeito da cerveja, mas era impossível com apenas um gole. Eu ainda podia senti-la descendo pela minha garganta, eu ainda me sentia lúcida o suficiente pra saber bem o que estava vendo. Aquilo era real, ele realmente estava ali, a poucos metros, me encarando como se soubesse que eu estava precisando de ajuda, como se soubesse que eu não estava ali por vontade própria. Seu olhar estava fincado no meu, extremamente sério, intrigado, preocupado. Havia muito mais coisas naqueles olhos do que eu podia descrever, me prendendo, me imobilizando, me retraindo. 
Eu já devia imaginar que Arthur Aguiar estaria naquela festa. 
Não sei por que fiquei tão surpresa, afinal, ele era praticamente fixo da Maria, todas as garotas de seu bandinho sabiam que ele era quase uma propriedade dela. Mas parecia que naquela noite ele estava liberado de sua monogamia, porque três garotas o rodeavam, uma mais descoberta que a outra. Arthur estava sentado num sofá perto de onde eu estava, com os braços abertos e apoiados no encosto do móvel, e tinha uma garota de cada lado seu, acariciando seu peito e sussurrando em seu ouvido com sorrisos pervertidos. Fora a terceira, que tinha uma perna de cada lado de seu quadril e estava sentada em seu colo, beijando-lhe indecentemente o pescoço. Mas apesar de tudo aquilo, era em mim que seu olhar repousava, como se tentasse descobrir o motivo de minha presença. 
Desviei meu olhar do dele, sentindo meu coração disparar. Não estava sendo nada agradável estar sendo observada daquele jeito tão invasivo por uma pessoa como ele, o que só aumentava minha vontade de cometer suicídio por estar ali. Dei mais um grande gole na minha cerveja, encarando qualquer ponto ao meu redor que estivesse distante dele, mas meus olhos se recusaram a me obedecer quando o professor Aguiar se livrou das três garotas que o provocavam e caminhou rapidamente na direção de Maria, que passava por perto. Ele a segurou bruscamente pelo braço, de cara fechada, e disse algo em seu ouvido, pra que a música ensurdecedora não a impedisse de ouvi-lo. Afirmei pra mim mesma que aquela conversa tensa que se desenrolava entre os dois não podia ter a mínima relação comigo, mas ainda assim era impossível não observá-los. 
Pela repentina mudança de humor de Maria, a conversa não estava sendo das melhores. Arthur falava entusiasticamente em seu ouvido, gesticulando de leve com uma lata de cerveja nas mãos e com a testa constantemente franzida, e Maria o respondia com incredulidade, com as mãos na cintura. Após um tempo de conversa, ela, que estava de costas pra mim, virou o rosto na minha direção e me lançou um olhar fuzilante. Arthur simplesmente disse mais algumas palavras, mantendo a expressão séria, e se afastou rapidamente, encolhendo seus ombros largos para poder passar pela multidão desvairada. Desviei meu olhar do dela, engolindo depressa o resto da minha cerveja, já sem tanta certeza de que aquilo não era sobre mim. 
Os minutos foram se arrastando torturantemente, as cervejas foram descendo uma a uma, e uns quarenta minutos depois, eu já tinha perdido a conta de quantas latinhas tinha tomado. Tudo que eu sabia era que as coisas estavam meio confusas ao meu redor. As pessoas pareciam se mexer em flashes de imagens, e não mais continuamente, os sons se tornaram um pouco mais abafados, mas apesar dos sintomas de embriaguez, eu me sentia lúcida o suficiente pra ouvir os urros de depressão que ainda vinham de dentro de mim por ter que estar ali. Tomei um gole da cerveja que tinha pedido, mas aquilo era como água pra mim agora, descia pela minha garganta sem fazer a menor diferença. Só aquilo de álcool não estava bastando pra abafar minha frustração. 
Resolvi me levantar, com uma leve vertigem, e caminhei vagarosamente pelas pessoas, tentando não deixar que a música abafada por um zunido estranho em meu ouvido estourasse meus tímpanos. Não demorou muito e eu encontrei uma grande passagem para outro cômodo bem mais vazio e silencioso: a cozinha. Pouquíssimas pessoas estavam ali, bebendo tequila com limão numa rodinha, entre elas um menino de olhos verdes faiscantes e cabelos compridos queimados de sol. Assim que avancei na direção de um armário, em busca de alguma bebida mais forte, notei que seus olhos me acompanharam, brilhando de interesse. Bem que minha mãe dizia que aquele vestido caía bem em mim. 

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